Operação Fura-fila foi deflagrada nesta
terça (20). Ao todo, foram cumpridos mandados de prisão e de busca e apreensão
em 10 cidades potiguares e em São Paulo
*Atualizado às 9h15.
O Ministério Público do Rio Grande do Norte
(MPRN) deflagrou nesta terça-feira (20) a operação Fura-fila. O objetivo é
desmontar um suposto esquema de fraudes no sistema de marcação de consultas e
exames do Sistema Único de Saúde (SUS) no Estado. Um deputado estadual é
suspeito de envolvimento com o esquema. Um vereador de Parnamirim foi preso e
cinco secretários municipais de Saúde e de Assistência Social, afastados dos
cargos.
As investigações do MPRN foram iniciadas em
2019, após denúncias de servidores da Secretaria Estadual de Saúde Pública
(Sesap). Na apuração, o MPRN descobriu que desde 2017 a organização criminosa
inseria dados falsos e alterava informações legítimas no Sistema Integrado de
Gerenciamento de Usuários do SUS (SIGUS), sistema informatizado utilizado pela
Sesap e por alguns municípios do Estado para regular a oferta, autorização,
agendamento e controle de procedimentos ofertados pelo SUS. Essas invasões na
ferramenta de regulação interferem na sequência de elegibilidade de procedimentos
médicos gerenciados pelo Sistema. Desta forma, o grupo furava a chamada “fila
do SUS”, propiciando vantagens indevidas aos fraudadores.
Com o apoio da Polícia Militar, a operação
Fura-fila cumpriu dois mandados de prisão preventiva, um mandado de prisão
temporária e ainda outros 22 mandados de busca e apreensão nas cidades de
Natal, Parnamirim, Mossoró, Caicó, Monte Alegre, Areia Branca, Brejinho,
Frutuoso Gomes, Rafael Godeiro e Passa e Fica. Também houve o cumprimento de um
mandado de busca e apreensão na cidade de São Paulo. Ao todo, 27 promotores de
Justiça, 42 servidores do MPRN e 90 policiais militares participaram da ação.
O MPRN apurou que o esquema seria
encabeçado por Diogo Rodrigues da Silva, eleito vereador por Parnamirim em
2020. Ainda antes de se eleger, valendo-se de sua posição dentro da estrutura
administrativa municipal, Diogo Rodrigues teria montado o esquema de inserção
de dados falsos no SIGUS, burlando a fila do SUS. A suspeita é que ele teria
como braço-direito no esquema a própria companheira, Monikely Nunes Santos, que
é funcionária de um cartório em Parnamirim.
O casal é investigado pelos crimes de
estelionato, exercício ilegal da medicina, falsidade ideológica, peculato,
inserção de dados falsos em sistema de informações, lavagem de dinheiro e
organização criminosa. Para o cometimento dos delitos, Diogo Rodrigues e
Monikely Santos, que foram presos preventivamente, supostamente contavam com o
apoio direto de outras pessoas, também alvo das investigações do MPRN.
Uma dessas pessoas seria o deputado
estadual Manoel Cunha Neto, conhecido por Souza. Ele é investigado pela prática
de peculato eletrônico, falsidade ideológica e corrupção passiva. Um mandado de
busca e apreensão foi cumprido na residência de Souza. O Tribunal de Justiça do
RN afastou o foro por prerrogativa de função do deputado porque os crimes
investigados em nada têm a ver com as atribuições parlamentares de Souza,
conforme previsto na Constituição do Estado do Rio Grande do Norte e no
Regimento Interno da Assembleia Legislativa do Estado. De acordo com as
investigações do MPRN, o deputado é suspeito de manter contato direto com Diogo
Rodrigues para que fossem inseridos nomes de interessados no Sistema do SUS.
Em uma conversa por aplicativo de mensagens
no dia 18 de fevereiro de 2020, Diogo reforçou com Souza sobre uma possível
blindagem contra a investigação do MPRN: “O caldo vai engrossar e vou precisar
de gás”, escreveu o vereador ao deputado, sugerindo que estaria envolvido em
alguma situação difícil ou complicada e que precisaria da ajuda da Assembleia
Legislativa do RN.
Outra pessoa investigada é Bruno Eduardo
Rocha de Medeiros, que foi sócio da Medeiros e Rocha LTDA, empresa responsável
pelo SIGUS. O MPRN suspeita que Bruno Medeiros alterava dados do Sistema de
forma a dificultar a identificação posterior dos médicos que autorizam cada
exame. Ele foi preso temporariamente para evitar que, devido ao conhecimento do
sistema burlado, não possa alterar dados e informações armazenados na “nuvem”
ou destruir provas ainda não coletadas contra o grupo. Mandados de busca e
apreensão foram cumpridos na residência de Bruno Medeiros e também na sede da
empresa.
Secretários municipais de Saúde e de
Assistência Social também estariam envolvidos com o esquema fraudulento. O MPRN
apurou que cinco mantinham ligação direta com Diogo Rodrigues. Por esse motivo,
a Justiça determinou o afastamento e a proibição de ocupar cargo comissionado
ou de ser contratado temporariamente pelo Poder Público pelo prazo de seis
meses de Gleycy da Silva Pessoa, secretária de Saúde de Brejinho; Maria
Madalena Paulo Torres, secretária de Saúde de Frutuoso Gomes; Alberto de
Carvalho Araújo Neto, secretário de Saúde de Arês; Anna Cely de Carvalho
Bezerra, secretária de Assistência Social de Brejinho, e Eliege da Silva
Oliveira, ex-secretária de Saúde de Ielmo Marinho.
O MPRN levantou que esses secretários
remuneravam Diogo Rodrigues ilicitamente, através de contratos com laranjas do
grupo, notadamente familiares do vereador suspeito.
O MPRN suspeita que Eliege da Silva
Oliveira mantinha contato constante com Diogo Rodrigues por meio de dois
terminais telefônicos, havendo, respectivamente, 522 e 739 mensagens trocadas
entre eles somente no período investigado. Entre 3 de julho de 2017 e 23 de outubro
de 2018, Gleicy da Silva Pessoa trocou 8.006 mensagens com Diogo Rodrigues.
De acordo com a investigação, Maria
Madalena Paulo Torres supostamente mantinha relação de negócios e troca de
favorecimentos pessoais com Diogo Rodrigues. Alberto de Carvalho Araújo Neto,
que também já foi secretário de Saúde da cidade de Lagoa de Pedras, também é
suspeito de manter contato com Diogo Rodrigues, com quem teria trocado 4.650
mensagens, na grande maioria referentes à marcação de exames. E Anna Cely de
Carvalho Bezerra também é suspeita de ter trocado com Diogo Rodrigues 1.079
mensagens, no período de 28 de novembro de 2017 a 23 de outubro de 2018.
De posse do material apreendido, o MPRN irá
aprofundar as investigações sobre a atuação da organização criminosa e apurar
de há mais pessoas envolvidas com as fraudes no esquema de fura-fila do SUS no
Rio Grande do Norte.