“Não desperdiçamos esta crise. Dela pode nascer a
solidariedade global”, recomendou Yuval Noah Harari, o filósofo e historiador
israelense, ao ser entrevistado pelo jornal italiano “Corriere
della Sera”.
A crise pandêmica está batendo na nossa face egoísta. Os
grandes líderes governamentais ainda resistem em assumir um compromisso global
no combate ao Covid-19. Muitos deles ficam fomentando o ódio, a conspiração,
culpando interesses ideológicos, religiosos, políticos pela criação e
proliferação do vírus. Trump acusa os chineses. A Índia acusa os muçulmanos e
estes, por sua vez, acusam Israel. No Brasil, grupos conspiracionistas veem o
coronavírus como uma invenção comunista. No campo do fundamentalismo religioso,
há grupos que veem o vírus como um castigo enviado por Deus, revelando, desse
modo, a raiva divina contra a humanidade corrompida.
Não obstante à infinidade de visões distorcidas da atual
crise, o coronavírus está nos obrigando a quebrarmos as barreiras culturais,
políticas e geográficas e nos vermos como uma única comunidade planetária. Aos
olhos do vírus, pouco importa se somos brasileiros ou italianos, religioso ou
ateu, rico ou pobre.
A saída mais sustentável e relevante que a humanidade
deve abraçar já agora e depois da pandemia é edificar os princípios da
solidariedade global. Com ela, não só venceremos o vírus da Covid-19, mas “os
demônios interiores do gênero humano, como o ódio e a ganância. O ódio é o
resultado de uma solução falsa: o perigo é o outro. A ganância enriquece
poucos, prejudica muitos e favorece o vírus” (Harari).
Na mesma direção, filósofos contemporâneos, como o
italiano Luciano
Floridi e o tunisiano Pierre Levy, também veem a conscientização
da Unidade e da Solidariedade Global como a resposta mais sustentável
aos desafios do século XXI. Ambos acreditam que as novas tecnologias digitais,
se as utilizamos de forma adequada, podem fazer frente aos desafios que se
aceleram logo após o término da pandemia: crise econômica, desigualdade social
e o sofrimento de milhões de pessoas.
Pierre Levy, em um comentário no seu blog, disse que:
Embora a humanidade esteja neste momento com uma coroa de espinho no crânio
sangrento, ela está entrando em uma nova era, preparando os caminhos para uma
nova humanidade. “Para fornecer soluções para esta crise multifacetada,
novas formas de inteligência coletiva estão ultrapassando instituições oficiais
e barreiras nacionais, particularmente nos campos científico e de saúde”. Tudo
isso é possível, complementa Levy, graças aos serviços acessíveis nas
plataformas digitais: educação, medicina, supermercado, entretenimento. A
internet agora é, mais do que nunca, um direito humano fundamental, porque
tornou-se o espaço público, por meio do qual funciona as principais
infraestruturas de atendimento aos serviços básicos aos cidadãos.
Os filósofos sempre veem as crises globais como
oportunidade de crescimento e amadurecimento humano. Harari, ao ser questionado
no final da entrevista ao jornal “Corriere della Sera”, sobre qual seria a sua
maior esperança após a pandemia, respondeu: “Que, com a crise, as pessoas
entendam a importância da solidariedade global para os desafios comuns: nossa
saúde e a saúde do planeta estão conectadas; espero que reverta o crescimento
dos populistas de direita: a crise revelou que os populistas são incapazes de
defender seu povo. Precisamos de um nacionalismo melhor”.
Assim como os filósofos, penso que todos nós
compartilhamos do mesmo desejo: aquele de crescermos em humanidade e de
difundirmos amplamente um projeto de cooperação e de solidariedade global, para
respondermos os grandes desafios “glocais” (global e local) do século XXI.
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