Por Rosa
Freitas*
Por essa, o velho Gutemberg não esperaria: ver sua
fabulosa invenção do século XV perder o posto de maior meio de transmissão do
saber. Gutemberg inventou um dos mais memoráveis instrumentos da revolução
moderna: a imprensa. Muito além da engenhoca adaptada do arado, a facilidade
que criou foi fundamental para a difusão do conhecimento e da informação por
mais de 500 anos.
O poder da palavra foi transmitido e imortalizado,
amplamente distribuído e usado das mais variadas formas. No século XIX, as
notícias, os anúncios, fofocas e contos chegaram a um número cada vez maior de
letrados. A máquina se confundiu com a informação e quando falamos
"imprensa" vem a nossa mente um grande aparato econômico e político
de criação de conteúdo.
Seu uso? Oh, serve a tantas coisas.... para o bem ou para
o mal, à direita, à esquerda, o que não é, é neutra.
Há um tempo, os cientistas políticos e sociólogos
perceberam seu poder. Cooptado por setores econômicos, os jornais, revistas e
magazines criaram as demandas para seus produtos, ditaram modas e refizeram
costumes.
Habermas criticou duramente o papel da imprensa comercial
na transmissão da informação. Ao precisar de um anunciante, ela não pode
"dizer" o que precisa ser dito. Sob a ótica da experiência cotidiana,
gostoso era receber o jornal todos os dias nas portas das casas ou nos finais
de semana.
Ler os editoriais e se indignar ou aplaudir, no banco da
praça ou do sofá. Antes do café da manhã, para não sair de casa sem saber os
assuntos do dia.
O jornal impresso mudou, não sei se somente a forma, já
que nessas relações necessárias entre o meio e o conteúdo, algo se perde ou se
ganha.
O que se perde parece que estamos descobrindo a cada dia.
O jornaleiro do bairro que fechou, o idoso com seu jornal no banco da praça
deixou de existir.
Somos ainda a última geração tátil. Precisamos ainda
tocar cada coisa, para sentir que ela exista. Talvez um São Tomé com roupas do
século XXI em transição para Android.
Mas, definitivamente, os últimos sapiens desse tipo.
É através desse pequeno instrumento portátil, o celular,
que temos um mundo aberto e em tempo real. É tanta notícia, que a novidade se
perde no instantâneo. Somos consumidores de informações. Antes era necessária
uma grande máquina de impressão para fazer uma notícia circular.
Hoje, basta a ideia, uma tela, um perfil. Dos grandes
aparatos de imprensa aos pequenos blogs, a imprensa e a informação se
confundiram. Meio e conteúdo são um só.
O mundo virtual é o real e não material, como ensinou
Pierre Levy. É um mundo fluído e líquido. Se a inteligência artificial consegue
identificar padrões e manipular as sensações, as revoluções também se fazem a
partir das pontas dos dedos, como a primavera árabe.
Por mais estranho que pareça, na sociedade informacional
de economia criativa são possíveis canais com independência na proposição de
conteúdo. É essa contradição da dialética, cada coisa traz dentro de si o seu
próprio mal. São os blogs de jornalistas independentes, youtuberes, as aulas
virtuais etc.
Nada pode conter seu fluxo. Admirável mundo novo,
temos! Assim, o velho Gutemberg vive a cada clique, porque deixou de ser
a velha engenhosa para ser ideia.
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