terça-feira, 28 de janeiro de 2020

Prefeito itinerante é proibido, mas lançar parente pode

Por Diana Câmara*

Não é incomum vermos uma família se perpetuar no poder em uma região e administrar várias cidades ao mesmo tempo ou sair migrando pelos municípios limítrofes sempre que o mandato está chegando ao fim. A Constituição Federal veda o terceiro mandato a fim de evitar a perpetuação de uma mesma pessoa no poder. Por isso, é certo que um prefeito só pode tentar uma reeleição seguida no seu município e está impedido de disputar eleição para chefe do executivo de cidades vizinhas. E como a Justiça encara esse impedimento em relação aos parentes? Existe inelegibilidade reflexa? Um prefeito reeleito pode lançar sua esposa ou filho para ser candidato a prefeita (o) no município vizinho onde exerce forte poder político?

A CF/88, em seu artigo 14, § 7º, diz que a são inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consangüíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, de mandatário do poder executivo ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já é titular de mandato eletivo e candidato à reeleição. Ou seja, a limitação trazida pela Carta Magna se restringe ao território onde é exercido o cargo e, por isso, não permite uma interpretação mais larga no que tange aos parentes do chefe do executivo. A lei permite e a jurisprudência é amplamente pacífica quanto a isso. Assim, nas Eleições de 2020 é possível que os parentes de atuais prefeitos disputem o cargo de prefeito em municípios vizinhos sem o menor constrangimento ou impedimento legal.

O STF, sob o regime da repercussão geral, firmou o entendimento de que o art. 14 , § 5º da Constituição deve ser interpretado no sentido de que a proibição da segunda reeleição torna inelegível para o cargo de chefe do Poder Executivo o cidadão que já exerceu dois mandatos consecutivos em cargo da mesma natureza, ainda que em ente da federação diverso. Conforme o entendimento da Suprema Corte, tal interpretação seria necessária, à luz do princípio republicano, para impedir a perpetuação de uma mesma pessoa no poder, criando a figura do "prefeito itinerante". Todavia, o entendimento do STF a respeito da inelegibilidade do "prefeito itinerante" não pode ser aplicado, automaticamente, ao caso de inelegibilidade reflexa. Especialmente porque este entendimento conferiu interpretação ao art. 14, § 5º, da CF/88, que trata do próprio mandatário do poder executivo e não dos seus parentes, objeto do art. 14, § 7º, da CF/88.

Assim, em síntese, quanto ao próprio prefeito é vedado concorrer em município limítrofe o que configuraria “prefeito itinerante” ou até mesmo concorrer como vice-prefeito, pois seria enquadrado como “terceiro mandato”, já quem tem possibilidade de assumir o poder no caso de impedimento do titular. Quanto aos parentes, estes só não podem vir candidatos no próprio quintal, mas estão livres, leves e soltos para disputar cargos nas cidades vizinhas.

*Advogada especialista em Direito Eleitoral, presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/PE, membro fundadora e ex-presidente do Instituto de Direito Eleitoral e Público de Pernambuco (IDEPPE), membro fundadora da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (ABRADEP) e autora de livros.


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