domingo, 21 de julho de 2019

Os valores implícitos na adjetivação de “paraíbas” ao Nordestino

Tendo estudado ou não Geografia, grande parte dos nordestinos sabe, entre estes muitos que não sabem ler e nem escrever porque dedicaram sua vida a resistir aos encautos do clima semiárido, que somos um povo diferente de todos os outros do resto do Brasil. Não foi a toa que o pré-moderno Euclides da Cunha escreveu em sua obra  OS SERTÕES que “o sertanejo é antes de tudo um forte”, quando se referiu ao aspecto climático do Nordeste brasileiro.

Somos ascendência de um povo descrito pelos cronistas portugueses da época da colonização, como é o caso do Gabriel Soares de Sousa no seu TRATADO DESCRITIVO DO BRASIL, de 1587, como selvagem e bárbaro, adjetivos direcionados àqueles índios chamados de “tapuias” que habitavam as encostas dos rio Paraíba, Maranhão e Rio Grande e eram valentes e guerreiros ao defender as suas lavouras que ora estavam sendo invadidas pelos europeus exploradores.

Não obstante, esses povos primeiros tiveram comportamentos muito parecidos com o povo de Canudos na Bahia no final do século XIX ao defenderem a sua aldeia quando o Governo da República Velha não os aceitou com suas especificidades culturais e religiosas. A descrição de Euclides da Cunha àquele sertanejo não foi, mais uma vez reafirmando, do nada.

O nordestino não foge também da descrição bastante prática e real que marca a sua característica linguística, também herdada de sua ancestralidade autóctona, dada pelo poeta Patativa do Assaré, que tão bem demonstra o espírito forte e lutador desse povo, através de seus textos originalmente escritos no nosso dialeto.

Também nos adequamos, nós nordestinos, a todas as caricaturas personalísticas propostas pelo nosso mais atual literato que o espírito ainda soa bastante vivo na nossa memória, o dramaturgo Ariano Suassuna, nosso contemporâneo “paraíba”.

Ao mundo afora, também não fugimos dos tantos efeitos de estilos que enfeitam a musicalidade, o ritmo, as melodias e notas empregados para dar sentido à arte nordestina que incendeia mundos e fundos, dentro e fora do Brasil e encanta os mais inteligentes apreciadores.

Não estaríamos tão distantes da adjetivação proposta pelo nobre Presidente Jair Bolsonaro, caso os motivos, o contexto e os fatores que lhes obrigam a descrever o nordestino como “paraíba” fossem os mesmos utilizados em todos esses contextos artísticos que descrevemos, pois são eles que revelam nossa mais nobre individualidade enquanto indivíduo social de caráter especial da nossa nação.

Não. Não ficaríamos irritados, muito menos indignados.

O problema é que, na sua fala, que até agora não sei se adquirida criminosamente ou não ou se captada por acaso, já que vivemos a Era da Tecnologia Digital e temos em mãos, quase sempre, um desses aparelhos que captam imagens e sons e podemos usá-lo de muitas formas e para atender diversos interesses, os valores de referência negativa ao povo nordestino foram veementes. Inegáveis, na sua expressão discursiva e física, na sua linguagem, que já é perceptivelmente específica.

Como sabemos que todo discurso é intencional, não há como não perceber que os valores ali difusos são amplamente negativos, para desqualificar e estimular uma retórica pejorativa, preconceituosa, que faz-nos ocupar o lugar de algo JOCOSO.

Lamentável saber que temos um presidente que tem em sua expressão física o exemplo caucasiano de gente elevadamente desenvolvida, mas, que se utiliza de um comportamento tão VULGAR para falar de “gentes” que pagam impostos, compram, vendem, trabalham, comem e bebem e têm os mesmos direitos instituídos na legislação de uma nação a qual esse senhor governa e que se orgulha, NÃO SE ENVERGONHA, do que já produziu em termos de patrimônio material e imaterial ao Brasil.

Por Mônica Freitas

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