Tendo estudado ou não Geografia, grande parte dos
nordestinos sabe, entre estes muitos que não sabem ler e nem escrever porque
dedicaram sua vida a resistir aos encautos do clima semiárido, que somos um
povo diferente de todos os outros do resto do Brasil. Não foi a toa que o
pré-moderno Euclides da Cunha escreveu em sua obra OS SERTÕES que “o
sertanejo é antes de tudo um forte”, quando se referiu ao aspecto climático do
Nordeste brasileiro.
Somos ascendência de um povo descrito pelos cronistas
portugueses da época da colonização, como é o caso do Gabriel Soares de Sousa
no seu TRATADO DESCRITIVO DO BRASIL, de 1587, como selvagem e bárbaro,
adjetivos direcionados àqueles índios chamados de “tapuias” que habitavam as
encostas dos rio Paraíba, Maranhão e Rio Grande e eram valentes e guerreiros ao
defender as suas lavouras que ora estavam sendo invadidas pelos europeus
exploradores.
Não obstante, esses povos primeiros tiveram
comportamentos muito parecidos com o povo de Canudos na Bahia no final do
século XIX ao defenderem a sua aldeia quando o Governo da República Velha não
os aceitou com suas especificidades culturais e religiosas. A descrição de
Euclides da Cunha àquele sertanejo não foi, mais uma vez reafirmando, do nada.
O nordestino não foge também da descrição bastante
prática e real que marca a sua característica linguística, também herdada de
sua ancestralidade autóctona, dada pelo poeta Patativa do Assaré, que tão bem
demonstra o espírito forte e lutador desse povo, através de seus textos
originalmente escritos no nosso dialeto.
Também nos adequamos, nós nordestinos, a todas as
caricaturas personalísticas propostas pelo nosso mais atual literato que o
espírito ainda soa bastante vivo na nossa memória, o dramaturgo Ariano
Suassuna, nosso contemporâneo “paraíba”.
Ao mundo afora, também não fugimos dos tantos efeitos de
estilos que enfeitam a musicalidade, o ritmo, as melodias e notas empregados
para dar sentido à arte nordestina que incendeia mundos e fundos, dentro e fora
do Brasil e encanta os mais inteligentes apreciadores.
Não estaríamos tão distantes da adjetivação proposta pelo
nobre Presidente Jair Bolsonaro, caso os motivos, o contexto e os fatores que
lhes obrigam a descrever o nordestino como “paraíba” fossem os mesmos
utilizados em todos esses contextos artísticos que descrevemos, pois são eles
que revelam nossa mais nobre individualidade enquanto indivíduo social de
caráter especial da nossa nação.
Não. Não ficaríamos irritados, muito menos indignados.
O problema é que, na sua fala, que até agora não sei se
adquirida criminosamente ou não ou se captada por acaso, já que vivemos a Era
da Tecnologia Digital e temos em mãos, quase sempre, um desses aparelhos que
captam imagens e sons e podemos usá-lo de muitas formas e para atender diversos
interesses, os valores de referência negativa ao povo nordestino foram
veementes. Inegáveis, na sua expressão discursiva e física, na sua linguagem,
que já é perceptivelmente específica.
Como sabemos que todo discurso é intencional, não há como
não perceber que os valores ali difusos são amplamente negativos, para
desqualificar e estimular uma retórica pejorativa, preconceituosa, que faz-nos
ocupar o lugar de algo JOCOSO.
Lamentável saber que temos um presidente que tem em sua
expressão física o exemplo caucasiano de gente elevadamente desenvolvida, mas,
que se utiliza de um comportamento tão VULGAR para falar de “gentes” que pagam
impostos, compram, vendem, trabalham, comem e bebem e têm os mesmos direitos
instituídos na legislação de uma nação a qual esse senhor governa e que se
orgulha, NÃO SE ENVERGONHA, do que já produziu em termos de patrimônio material
e imaterial ao Brasil.
Por Mônica Freitas
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