sábado, 9 de junho de 2018

A amarelinha perdeu o posto?

A apropriação política da camisa da seleção reflete os ânimos dos brasileiros às vésperas da copa na Rússia

ÉPOCA - Tatiana Furtado

>> Trecho da reportagem de capa de ÉPOCA desta semana

Fanático por futebol, o cantor e compositor Lucas Santtana, de 47 anos, vai torcer pelo time do Brasil usando uma camiseta vermelha com a inscrição SBF, de Seleção Brasileira de Futebol, na parte da frente. Atrás, o número 16 e a inscrição “Foi golpe”. O número se refere a 2016, o ano do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.

O artista baiano providenciou um uniforme igual para seu filho Josué, de 15 anos. “Não uso uma camisa da CBF de maneira alguma. Pode-se torcer com uma camisa rosa ou qualquer outra. Não é a camisa que é a dona da paixão pelo futebol.” Torcedor do Bahia e do Flamengo, Santtana não descarta utilizar em alguns jogos um uniforme comemorativo do time baiano, em verde e amarelo, para apoiar a Seleção.

Assim como Santtana, muita gente descontente com o governo Michel Temer se recusa a vestir a camisa amarela associada aos que foram às ruas se manifestar contra a corrupção no governo petista e a favor da saída da então presidente da República. “Está chegando a Copa, e não vejo ninguém com a camisa do Brasil. Porque essa camisa virou sinônimo de filho da p..., de golpista”, protestou o músico João Gordo na Virada Cultural, evento realizado em São Paulo no mês passado.

Depois do impeachment, o escritor Marcelo Rubens Paiva jogou fora as duas camisas que tinha da Seleção, uma amarela e a outra azul. Ainda não decidiu, mas é provável que torça com a camisa do Corinthians. “Não dá para vestir a camisa da Seleção, que virou símbolo de uma massa de manobra comandada por golpistas”, afirmou. O perfil dos atuais jogadores não contribui para que mude de posição. “São despolitizados. Não estão nem aí com a situação do país. Gostam de andar de helicóptero. Esta é a Seleção Ostentação.”

O uso do uniforme da Seleção pelos “coxinhas”, alcunha utilizada pela esquerda, não é o único motivo das resistências à camisa. As acusações de recebimento de propina contra Ricardo Teixeira, a prisão do ex-presidente da CBF José Maria Marin nos Estados Unidos e o banimento de Marco Polo Del Nero do futebol, ordenado pela Fifa, reforçam o repúdio ao escudo da entidade máxima do futebol brasileiro.

“Vou assistir com um helicóptero de cocaína na camiseta para homenagear o diretor da CBF”, disse Gregório Duvivier ao ser indagado sobre qual traje usará na Copa. O ator e humorista se refere a Gustavo Perrella, nomeado em janeiro diretor de Desenvolvimento e Projetos da CBF. Ex-deputado federal e filho do senador Zeze Perrella (MDB-MG), ele ganhou as manchetes há cinco anos, quando a Polícia Federal apreendeu um helicóptero de sua empresa com quase meia tonelada de cocaína. O inquérito da PF afastou qualquer responsabilidade de Perrella no caso.

Nem todos na esquerda manifestam aversão à camisa da Seleção. Preso desde 7 de abril no prédio da Polícia Federal em Curitiba, Paraná, condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva torcerá com a amarelinha, pelo menos segundo o deputado Wadih Damous (PT-RJ), que o visitou no último dia 30. “Acabo de visitar o presidente Lula. Já estava de camisa amarela para torcer pelo Brasil”, afirmou em seu Twitter.

* Colaboraram Ruan de Sousa Gabriel

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