A primeira polêmica que
acompanhei no nosso RN foi sobre a construção do chamado papodromo para
recepcionar o papa João Paulo II em Natal. Os críticos alegaram que o papa
poderia ser recebido sem o custoso equipamento. Mas venceram os que disseram
que o papodromo não seria um elefante branco, mas um grande centro de
convenções dentro da área administrativa do governo. Até um dia desses, após
ficar por anos fechado, o papodromo abrigava um restaurante.
A história do RN é marcada por promessas de tal calibre.
Vivemos sob o manto das grandes ações e obras redentoras, uma espécie de
malufismo camarão. O sonho de nos posicionar num suposto futuro de prosperidade
e modernidade é substituído pela realidade e por uma conta pesada. A mesma
situação ocorreu com a inacreditável derrubada do Machadinho e do Machadão e o
tal legado. É uma constante potiguar.
Na administração de pessoal não tem sido diferente. O RN,
pré-constituição de 1988, contou com janelas generosas de ingresso de hoje
servidores pelas fundações Walfredo Gurgel, José Augusto, pela Assembleia, etc.
E não apenas isso: desde Garibaldi, passando por Wilma, Iberê e Rosalba, todos
quando saíram aprovaram planos de cargos, carreiras e salários sabidamente sem
a menor condição de implementação. Tudo embalado pelo sentimento: não
serei mais o governador. O problema não será mais meu.
É impressionante comparar nossa folha com a da Paraíba,
com orçamento semelhante – cerca de 12 bilhões/ano -, e perceber que eles
gastam 1,2 bilhão a menos do que a gente com salários. Vale ressaltar que temos
53 mil servidores na ativa e eles cerca de 80 mil. Isto significa que lá há
mais professores, policiais e enfermeiros, prestando um serviço ostensivo aos
paraibanos e a um custo bem menor de que aqui.
Nossos poderes também apresentam condições bem especiais.
Só que para os poderes, apenas. Uma legislação retrógrada e não seguida pelo
resto do país e muito menos pela União faz com que eles recebam mais do que
precisam e tenham o direito de fazer poupança com recursos que deveriam
retornar para o tesouro estadual. É por isso que o Tribunal de Justiça do RN
conta com um custo bem mais elevado do que o TJ vizinho e entrega desempenho
menor para os seus jurisdicionados, conforme o CNJ. É por esse caminho que
nossa Assembléia, menor do que a da Paraíba, pesa mais no bolso do
contribuinte.
Mas não termina por aí. Escuta-se muito nos meios
empresariais que a Paraíba é mais eficiente na cobrança de impostos e que nós
perdemos muita receita. É preciso duvidar de tal eficiência e lançar lupas
sobre de que maneira e quem o Estado cobra. Aqui supermercados têm isenção e
subsídio de gás. Não há qualquer justificativa plausível e estratégica para
tanto. Não há guerra fiscal entre uma loja varejista de alimento daqui com as
de outros Estados. Nós não sairemos do RN para fazer feira na Paraíba ou em
Pernambuco. Não se defende aqui qualquer tipo de radicalismo anti empresarial.
As isenções são importantes, mas elas servem para atrair empresas de fora em
determinados setores econômicos, desde que comprovem devidamente que criarão
empregos e investirão nas nossas terras. Com estudo embasado e justificado no
sentido de provar que o desconto dado em impostos trará benefícios objetivos.
Isenção, quando funciona para praticamente todo mundo, não merece mais o nome
que carrega.
A fatura por essa equação toda estourou de forma
dramática agora. Não há mais paliativos já sacados no passado por Garibaldi,
quando vendeu a Cosern; por Wilma de Faria, que recebeu recursos generosos do
governo Lula; por Iberê, que recebeu empréstimo do judiciário; por Rosalba, que
só pagou dezembro e o décimo terceiro antes de deixar o mandato – muita gente
já não se lembra – porque sacou recursos do Funfir. É fundamental uma alteração
de rumo. Entretanto, por todas as resistências já levantadas pelos
hipertrofiados grupos de pressão contra qualquer tipo de mudança de sentido, é
ingênuo imaginar que sairá apenas de um governo.
Por isso vale, pelo histórico acima, enfatizar: a conta
não tem apenas uma pessoa ou um grupo responsável. Ela não é apenas de Robinson
Faria ou mesmo apenas da classe política local. É da classe política, dos
poderes constituídos, das representações patronais e de trabalhadores e dos
chamados “setores pensantes” da sociedade norte-riograndense. Sim, porque mesmo
diante de toda crise, não há números e estudos produzidos sobre o assunto nas
universidades, pelos institutos públicos e privados, imprensa, associações
patronais e de trabalhadores, etc. O que torna o contexto carente também de
reflexão.
Porém, ainda que tenha sido um revés erguido por muitos
braços, os responsáveis agora silenciam para o que importa e gritam diante de
questões secundárias ou criam fumaças contra o atual governo como forma de
demarcar o problema nele e impedir qualquer contaminação responsabilizadora –
verdadeira – para além de tal fronteira.
A crise do RN é uma espécie de filho sem pai nem mãe.
Apareceu numa cesta, está com muita fome e precisa de ajuda. Só que ninguém
aparece. Isto tudo é ruim porque, enquanto o debate sensato não acontecer, a
tendência é que, ainda que venha o socorro financeiro da União – não acredito
que a recomendação do MP de Contas reverta esta tendência -, a falta de grana
será novamente implacável. Só questão de tempo. Sem demagogia: a hora é para
uma urgente reforma do Estado. Quem sabe a extrema dificuldade atravessada não
seja um ponto de partida oportuno para tanto?
Por Daniel Menezes
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