Por Marcos
Pinto
As madrugadas desenroladas nos bastidores do poder estão
superpovoadas por vira-latas investidos do estonteante poder de mando.
Uns, já condenados por sentença transitado em julgado, estão a viver
a réplica coreográfica do inferno de Dante. Dividem celas
diminutas e sob rígidas imposições das normas prisionais. Vêem-se obrigados a
digerir alimentos acondicionados nas famosas quentinhas, de qualidade duvidosa.
Rosnam num esgar de ira ameaçadora, vomitando vilezas e insultos que
roubam-lhes até o refúgio das lágrimas.
Outros, que já
venderam até a alma ao Demo (Ou seria aos Demos?) Na dúbia e suspeita
delação premiada, andam lépidos e dissimulados no meio da sociedade, mesmo
tendo uma tornozeleira eletrônica oculta sob a caríssima indumentária. Não resistem
à menor lufada de moral republicana. De tanto furtarem e roubarem às
escâncaras, arrotam de fartos num exalar pútrido e fétido de cinismo e
desfaçatez.
São vira-latas que
surgem das sombras, sob os acordes do tilintar do vil metal.
Assusta-nos a constatação de que esses detestáveis e desprezíveis vira-latas
apresentam uma espécie do dom da ubiquidade. Estão
em todos os lugares – da sotaina à farda militar. Do mais
vulgar prostíbulo até a mais alta Corte do país.
Quando flagrados
na abjeta prática de ladravaz, injetam os olhos de ira biliosa e
vingativa. Revela-se-lhes um cinismo correlacionado com o diabo. Com a
fartura oriunda do butim, adquirem ábitos de glutão e de bêbado. Imprimem
um novo estilo comportamental, escudando-se em providencial orgulho, sob a
tutela dos sinais exteriores de portentosa riqueza.
Audaciosos, personificam
um perene monólogo, ligando a solidão voluntariosa a um viver de alma
penada e sebosa. Aparecem como se fossem os últimos representantes de uma
raça de chibatados incapazes de resistência moral ilibada. O materialismo
doentio que lhes corrói a alma passam a impressão de que seguem
como se aguardassem alguma coisa retardada de há muito.
Em suas madrugadas de vira-latas engendram um consórcio silente para o
comensal butim. Concorrem decisivamente para a falência da saúde pública, em
que a falta de insulina leva o diabético à morte; a criança a uma
infecção generalizada seguida de morte por inexistência de medicamentos
eficazes que a salvaria.
Levam à morte
prematura de jovens parturientes. Singulares particulares que nos revolta
diante a corrupção generalizada. São passageiros que lotam o trem da vida
puxando vagões cheios de sobressaltos da esperança, cujo combustível é a
amargura do desespero. Compõem semblantes numa triste expressão de
depressão.
No meio dos
labores e sabores constantes, esses vira-latas seguem regurgitando a vida
ponto a ponto, com a ganância e o egoísmo a observarem a predisposição fatal e
total para a vadiagem e para o vício. Espanta-nos a maneira vil
desses entes diabólicos dizendo as coisas com com notas altas na voz,
com impaciências nervosas de biliosos. A vida toda regulada por hábitos
peçonhentos.
Ademais, tem
as miseráveis resignações de um vira-latas expulso do rebuliço cotidiano.
Nunca capitularei com essa súcia de desordeiros. Esse desolador
cenário de perene madrugada dos vira-latas fará com que, mais tarde, ao
lembrá-lo, eu possa dizer: Período de que ainda hoje não posso lembrar sem
ranger os dentes e afogar os olhos em grossas lágrimas.
Inté.
Marcos Pinto é advogado e escritor.
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