Nós, apodienses, sempre
nos destacamos em situações ditas vexatórias, por sermos detentores de incrível
e rápida capacidade de discernimento, popularmente conhecida como capacidade de
tirocínio. É um dom natural que DEUS amalgamou nos homens e mulheres da terra
dos guerreiros e Caciques Itaú e Jenipapuassú, da etnia tapuias paiacus do
antigo Lago Pody.
Nesse contexto, sêo
Leonildes sempre se destacou como um dos antigos comerciantes da Praça de
Apodi, com incrível capacidade para vencer no seu ramo comercial, como realmente
venceu, após longas e árduas batalhas vividas entre preços e sobrepreços de
materiais para construção.
Mesmo aparentando
sisudez de homem duro, carrasco, carrancudo, sempre era flexível nos preços,
sempre segurando a tabela até o último instante, para só ceder no soar do
gongo, quando o cliente já se preparava para debandar rumo a outro
estabelecimento comercial do ramo de construções. Seo Leonildes era um homem um
tanto quanto arredio, impulsivo, arrebatador, inteligente, do tipo duro sem
jamais perder a ternura.
Era contumaz em ajudar
nas festas alusivas aos padroeiros da cidade, quer seja contribuindo
financeiramente, quer seja envidando esforços físicos para angariar prendas
para o leilão paroquial. Era uma alma imensa de generosidade e também de valentia
moral, mas irradiador de tranquilidade, de estímulo, de confiança e de ânimo.
Nascido em terras da
região da Areia, margem da Mãe-Lagoa de Apodi, desde cedo entregou-se aos
trabalhos árduos, que ao longo da sua trajetória de vida foram constantes e
seguros em produtividade. Encarnava o exato perfil do homem idealizador e
incansável na labuta diária. Tinha uma ampla visão no comparativo das coisas
pretéritas com as coisas atuais, dos pormenores e movimentos que o dinamismo da
tal evolução exerce, como que uma força coercitiva para que o homem atual adote
uma espécie de acomodação inflexível e imediata.
Diante observações
infundadas de alguns clientes acerca dos altos e baixos vividos no comércio da
compra e venda de materiais de construção, sempre alertava, frisando: "Os
tempos são outros!. Isso refletia uma espécie de alerta para que, vez por
outra, deve-se adotar uma perspectiva de administrar o seu comércio com um olho
no retrovisor e outro nas paralelas das minudências do momento, afastando qualquer
manifestação do ufanismo, da mentira deslavada e a propaganda descarada em
forma de marketing enganoso.
Foi um homem fisicamente
forte e espiritualmente superior. Em sua faina como comerciante, Sêo Leonildes
protagonizou algumas cenas deveras hilária. Fui testemunha ocular de uma peleja
no preço fixado para compra e venda de cano PVC ao meu prezado e distinto tio
paterno Paulo de Aristides Pinto, Professor, advogado e comerciante do ramo de
temperos e condimentos alimentícios.
Acompanhei o dito tio em
périplo por diversas lojas de venda de materiais de construção, fazendo valer
aquela antiga mania de barganhar nos preços, por menor que fosse a diferença.
para menos. Após passarmos por três lojas, nos dirigimos à loja de sêo
Leonildes, isso já beirando o meio dia. Fomos gentilmente recebidos, tratamento
costumeiro dispensado a todos os clientes, indistintamente. Fiquei ao largo,
observando a abertura do diálogo entre vendedor e comprador acerca do preço do
metro de cano PVC rígido 3/4.
Lembro-me que após Sêo
Leonildes informar o preço, o matreiro cliente fez a observação de que nas
lojas visitadas anteriormente o preço era dez centavos a menos, por metro do
cano. Aí começou uma peleja que se arrastou por longos 30 minutos, sem que seo
Leonildes arredasse pé no abatimento do preço, nem muito menos o não menos
teimoso cliente mudava a sua oferta de compra, sempre observando o nome do
outro dono da loja, que por sinal não era apodiense, já ameaçando retornar a
loja mencionada, já caminhando para a saída da loja.
Após muitos longos
suspiros, sêo Leonildes dirigiu-se à sua esposa dona Moça, que era o caixa no
momento, dizendo-lhe: "Moça, receba o dinheiro da compra aí feita pelo Dr.
Paulo de Aristides". De outra feita, sêo Leonildes fora vítima de um
assalto de um ousado meliante, como sempre praticado sob a tranquilidade do
horário do meio dia.
Só sêo Leonildes e dona
Moça se encontravam na loja, uma vez que os funcionários tinham saído para o
almoço. Eis que de forma sorrateira, o assaltante adentrou a loja com andar
calmo e aparentando certa tranquilidade, o que passou a impressão de ser apenas
mais um freguês. A essa altura, sêo Leonildes se dirige para o freguês
perguntando-lhe que material de construção o mesmo queria comprar, ouvindo o
suposto freguês afirmar-lhe, à queima-roupa, que se tratava de um assalto, ao
mesmo tempo em que punha a mão sobre a cintura, como que para mostrar que se
achava armado. Impassível, sêo Leonildes exclamou: - Deixe de besteira rapaz!
Ao ouvir tal
manifestação intempestiva de sêo Leonildes, eis que o bandido saca de um
revólver e encosta-o na barriga de sêo Leonildes, que também ligeiramente se
dirige à dona Moça, exortando-a: - Vá Moça, entregue todo o dinheiro a esse
rapaz!.
Né brincadeira não! É
assalto mesmo! Após esse constrangedor e inusitado incidente, o meliante saiu
calmamente, sem demonstrar nenhum receio de reprimenda por parte de sêo
Leonildes.
Era componente da velha
guarda dos comerciantes apodienses, cerrando fileiras ao lado de sêo Valdemiro
Custódio, Preto Custódio, João Custódio, Joel Câmara, Zé de Chico Pedro, sêo
Dioclécio Almeida, Fernando Menezes, Zé Sidô, Raimundo Monteiro Cavalcanti,
Mário Marinho da Mota, Aurino Gurgel, Chico do Canto, Chico Paizinho, Raimundo
Sena e tantos outros. que contribuíram de forma relevante para o desenvolvimento
da economia apodiense.
Quando sêo Leonildes se
admirava com um fato que lhe despertava sua atenção, após narrá-lo, sempre
exclamava, já esbaforido pelo calor insuportável: - Isso é uma coisa medonha!
Assim era o cidadão
LEONILDES MARCOLINO - Homem cordial e acessível, sem rancor e sem ódios. Um
gentleman à moda sertaneja.
por Marcos Pinto - advogado e escritor.
por Marcos Pinto - advogado e escritor.
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